sábado, 2 de agosto de 2008

Post meu noutro forum

Esta é uma das profissões mais solitárias do mundo.

Os lados bons da profissão já são largamente conhecidos por isso vou fazer o retrato do lado mau para aqueles que pensam que só tem lados bons. Repito este é a visão do lado mau, existe o lado bom.

São raros os dias em que estás em casa para poder estar com a família e muitas vezes quando estás, como não é fim-de-semana, as pessoas estão a trabalhar e acabas por passar o dia sozinho na mesma…

Começas a perder os amigos que não são da aviação… mas não é por mal, eles ligam-te cem vezes e só em 5 é que estavas cá, começam a desistir de te ligar, e mesmo quando apareces pareces completamente fora do contexto porque perdeste imenso da vida deles e das outras saídas e etc…
Agora transponham isto para a vossa família quer seja pais e irmãos ou marido/mulher e filhos. Não estavas cá quando ele falou, andou, esteve doente, nos aniversários, nos natais, não estavas cá quando faleceu alguém e eu precisava de ti aqui..

Todos os dias trabalhas com pessoas diferentes que não conheces e que mesmo que te dês muito bem com elas será apenas por umas horas ou uns dias e passarás anos sem trabalhar com eles outra vez…

Passas imensos dias fora de casa, e se no princípio é muito interessante ir conhecer as cidades e ver tudo o que nunca viste passado uns anos já não há nada de novo para ver e acabas por te virar para o quarto de hotel.

As vezes o hotel nem sequer é perto de nada, a maior parte das vezes as tripulações são instaladas em hotéis colados aos aeroportos que são a km de distância das cidades. E ou te propões a voltar para o aeroporto e apanhar o comboio que te leva uma hora para chegar ao centro ou ficas mesmo pelo hotel. Isto no verão não é muito complicado. Mas no Inverno, em que quanto mais para o leste da Europa, que é quase toda mais a norte do que nos, mais cedo anoitece. Se chegares a um hotel ás 15h deverás ter no máximo 2h de luz. Tens de trocar de roupa (e convém que tenhas roupa para as temperaturas que fazem nesses países) voltar para o aeroporto e fazer a viagem de uma hora. Quando chegas ao centro da cidade deves ter à volta de 30m de luz e um frio de rachar à tua espera…

Existe muitas vezes situações em que vais posicionado para um sítio e ficas nesse país sozinho e no dia seguinte voltas noutro avião com outra tripulação. Passas o dia inteiro sem ninguém. Agora imagina esta situação quando tens pais ou filhos ou alguém á tua espera do outro lado. E agora imagina isto no dia de natal, de passagem de ano, no teu aniversário ou no dos teus filhos… é natural que uma pessoa se vá entristecendo.


Tudo isto cria uma sensação de solidão enorme… Não é instantânea mas é daquelas coisas que vai moendo até se instalar. Temos, infelizmente, uma taxa de suicídio relativamente elevada.

É normal também que as pessoas utilizem mecanismos para dar a volta a esta situação. E se existem pessoas que lidam extremamente bem com esta situação existem outras que não. E para combater aquele vazio que têm no peito procuram a sensação de euforia para substituir a sensação de felicidade, uns através de ligações fortuitas com estranhos, outros através do álcool, outros drogas, todas estas ou outras…

Não estou a desculpar ninguém por comportamentos desviantes e ás vezes destrutivos, estou só a tentar explicar o que leva a que estas coisas aconteçam…
É preciso ter-se uma forma de estar e ser muito saudável para não te deixares arrastar para estas coisas ao longo dos anos.

Obviamente que não falo por mim, que estou no mundo da aviação à meio ano, ainda não preciso de procurar felicidade ou euforia… ainda estou assim e a tentar perceber a nova vida que me caiu no colo… falo do que vejo nas pessoas com quem trabalho e já vi tudo aquilo sobre o que falei.

No entanto já houve alturas em que precisei de estar com os meus e não pude… e tens de ir trabalhar e fazer o sorriso de sempre para os passageiros e para os colegas que não lhes vais estragar o dia a eles… E sentes o peso que é ser semi-emigrante, que no fundo é o que nós somos, semi-emigrantes.

1 comentário:

  1. Boa noite :)
    O meu nome é Soraia e há muito que sonho com a profissão de assistente de bordo. Estou no ensino superior mas não estou a gostar do curso. Visitei uma psicóloga vocacional e o concelho dela foi que falasse com uma profissional sobre esta profissão para saber se é mesmo isso que quero. Como não conheço ninguém na área decidi procurar em blogs. Se lhe puder fazer umas perguntas, agradeceria-lhe profundamente. Os melhores cumprimentos.

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